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Tuesday, January 19, 2010

Os que da lei da morte se libertam

Sobre aqueles que 'se vão da lei da morte libertando’, escreveu Camões, até talvez pouco confiante na grandiosa verdade que acabara de escrever. Olhar para a morte como o derradeiro lugar de oportunidade, pode ser estranho, mas talvez não seja assim tão incorrecto. Mas não é uma dissertação sobre a morte que me traz aqui. É uma dissertação sobre a vida…

Quando perdemos alguém, por muito difícil que nos seja encarar tal facto, guardamos as recordações e os momentos que nos marcaram de alguma forma. Podemos dizer que a força da recordação é a força que mantém determinadas pessoas ‘vivas’ em cada um de nós. Eu próprio já o escrevi. São essas pequenas lembranças que nos engancham à memória deste ou daquele momento, desta ou daquela pessoa, deste ou daquele dia. É tal como acontece com o povo. Se estudarmos Relações Internacionais (e todas as suas ‘afiliadas’) aprendemos que só há povo quando há memória colectiva. Histórias, dias, sucesso, vitórias, derrotas e fracassos comuns, celebrados e chorados em conjunto. Aplicando isto ao indivíduo, diria que uma das piores tragédias do ser humano seria a de perder a capacidade de guardar as suas memórias, quer as boas (por razões óbvias), quer as más (porque nos ajudam a lembrar o quão boas são as boas).

A modernidade tem-se esforçado por deixar de viver amarrada ao passado. E tem-no feito bem. Mas não pode cair no erro de esquecer a sua memória. Nem revivalistas, nem desconhecedores do passado. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Sejamos equilibrados, porque sem este equilíbrio, perderemos grande parte daquilo que somos. Há que estabelecer a diferença entre revivalismo fundamentalista, que deifica tudo o que é passado, e o apagar da memória colectiva, que nos trouxe até aqui, que fez de nós aquilo que somos, com todos os defeitos e virtudes que isso acarreta.

Talvez me perguntem porque escrevo sobre memória sendo tão novo. Eu explico. 25 anos é a minha idade. Hoje, vi falecer a minha avó Maria Luísa, a quem um acidente grave de viação retirou grande parte das faculdades físicas e mentais que tinha. Esse acidente ocorreu em Outubro de 82. Isto significa que vi partir alguém que, na realidade, nunca conheci. O único gancho que me segura à sua história são as histórias e as narrativas de quem conviveu com ela antes daquele dia. E se perder alguém cuja história nos marca directamente é doloroso, não pensei que lembrar-me que nunca conheci a minha avó, aquela avó dinâmica e cuidadosa, decidida e meiga, pastora e amiga, fosse tão difícil. Faltam-me palavras para expressar o vazio. A pena de não ter como recordar aquilo que a Maria Luísa Barradas foi verdadeiramente. Apenas ouvi falar dela…e isso não me chega…

Não é tarde para ganhar a memória. Vou agarrar no meu avô João (o único vivo agora) e vou escrever um livro com ele. Não é um livro de memórias, mas um livro de sabedoria, da sabedoria que emana de cada vez que ele fala. Quero que todos conheçam o homem que, de cada vez que abre a boca, me ‘mostra’ qualquer coisa nova sobre a Bíblia. E quero ter essa memória…

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