Venho de um fim-de-semana em que as coisas foram complicadas. No espaço de 2 dias perdi dois familiares, o que, como é óbvio, nos faz pensar na vida de forma mais crítica do que o usual. Afinal de contas, lidar com a sensação de que não voltaremos a ver alguém é das emoções com que maior dificuldade temos em lidar enquanto seres humanos.
Ontem foi o funeral de uma pessoa que me era (será que posso dizer que ainda é?) bastante querida: a minha avó materna. Quando era criança passei horas, dias, semanas e até meses na casa dos meus avós Marcolina e Manel Henriques. Devo-lhes tantas coisas. O meu avô partiu em 2003. A minha avô partiu na última sexta-feira. Mas há uma coisa que não parte. É que as lembranças que tenho deles são fantásticas. O meu avô, companheiro, que me levava para todo o lado, que, no meu quintal, fez centenas de remates que tentava defender o melhor que conseguia, que me enviava 'A Bola' todas as segundas-feiras para eu ver os resultados dos jogos do fim-de-semana, camarada de centenas de jogos de futebol, especialmente do nosso Benfica (foi ele que me introduziu a esta 'doença'), que agarrava em mim de manhã, me levava para a 'horta', onde, no caminho, fazia a paragem obrigatória no 'Nabiças' , onde me dava pacotes de amendoins e me dizia sempre que não dissesse nada à minha avó, até porque tinha acabado de comer uma pratada de Estrelitas ao pequeno-almoço. A minha avó, que me fazia sempre aquela carninha com batatas fritas aos cubos, que me levava ao parque mesmo tendo de se certificar que não estava mais ninguém nos baloiços (porque de outro modo, eu não andava neles...), que me fazia aquela 'Sopa de Entulho' deliciosa e a deitar por fora e que eu comia na sala porque queria ver televisão, que me comprava sempre uma caixinha de 'Carrossel' para eu comer ao jantar, e que me ia buscar ao infantário que estava por detrás de casa, isto porque eu chorava se a via passar.
No fim de contas, eu sei que perdi a presença física, mas que ganhei a memória de alguém a quem devo tantas coisas. Ganhei a memória do carinho das pequenas coisas, que só se apagará quando eu me apagar também. Ganhei o carinho com que sempre me lembrarei de ambos. Ganhei a certeza que um dia voltaremos a ver-nos. E essa é a melhor herança que me podiam ter deixado...e que eu agradeço do fundo do meu coração...
A injustiça da parábola do filho pródigo
13 years ago
4 comentários:
Os meus sentimentos.
Que blog fantástico... e que herança fantástico guardaste para todo o sempre!!!
Um preço que estou disposto a pagar! :) Venha lá esse café!
Tens de agradecer ao teu amigo Tiago que me deu o link do teu blogue. Ou terei de ser eu a agradecer? whatever...=)
E assim que li este 1º texto não consegui deixar de comentar.
É verdade que quando perdemos alguem de quem gostamos muito, restam-nos muitas memórias. E ficamos gratos por termos esse coisa que mais nenhum ser tem que é a capacidade de nos lembrarmos do passado, até do mais distante. Eu perdi duas pessoas muito importantes para mim no espaço de 3 anos e pouco. E quando digo importantes, digo mesmo vitais (um irmao e o meu pai). E aquilo que me tem atormentado não é o mais recorrente: será que eles ainda existem? Mas sim "o que será que fizeram para o merecer?". Porque como podes imaginar nenhum deles tinha a idade dos teus avós, tendo partido demasiado cedo. O meu irmão tinha apenas 23 (a mnh idade actual) e o meu pai 58.
Não os lembro com tristeza, porque essa já lá vai...mas com saudade e alguma revolta. Por um lado porque preciso deles ou precisava...por outro porque mereciam ter tido mais tempo para concretizar mais sonhos.
E chateia-me um bocadinho quando alguem vem e diz "foi Deus que assim quis, tinha chegado a hora deles". Pois..mas se somos afinal, a sua criação mais bela, porque nos trata Ele como peças de xadrez?
bem, não quero lançar confusão, até porque eu mesma tenho em mim alguma fé, mas enquanto 'terráquia', não conheço outra forma de vida e custa-me a acreditar noutra dimensão. Ela existe? É tão boa ou melhor que esta? enfim...
Por acaso acabo de criar um blogue e foi por isso que o Tiago me deu o teu. Se quiseres passa lá: www.xiribietatata.blogspot.com
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